HISTÓRIAS DE GUARAPUAVA...
JORNAL A NOITE (RJ)-QUARTA FEIRA, 15 DE JANEIRO DE 1936.
Conhecer um homem, a quem a fortuna, através de um bilhete de loteria, teve o capricho de visitar inesperadamente , é sempre uma tarefa agradável. Mesmo que se tenha de viajar de Ponta Grossa até Guarapuava, rompendo trinta léguas de estrada áspera, na diligência que faz o serviço de passageiros e de Correio, em excursões periódicas, com uma regularidade precária. Aboletados no duro assento de um Ford V-8, convertido em jardineira, ei-nos rumando o terceiro planalto, enquanto uma chuvinha irritante alagava a paisagem. Valeria a pena o sacrifício?De Imbituva, uma boa auto estrada até Prudentópolis, já o caminho era vencido com maior dificuldade, lama, buracos e trilhos enormes abertos pelos carroções puxados por nove ou dez cavalos. E lá íamos aos bóleos, atras do homem dos 200 Contos...Duas horas depois de Prudentópolis começava a roncar , para vencer a imponente serra da esperança. Pedaço duro de conquistar. Mas bonito de se ver. Uma serrania majestosa, que faria abrir os olhos a muito turista desavisado. Agora o terceiro planalto. Mais algumas horas de viagem difícil e Guarapuava surge de imprevisto, numa volta da estrada. Cidade antiga, casario velho, também fundada ha 116 anos ...Depois de algumas informações , tocamo-nos para o “Bar América” instalado num corredor de casas acachapadas, bem no centro da cidade. Seu proprietário, disseram-nos ,era pessoa que procurávamos.
- O Sr. Francisco Demário?
- Sou eu mesmo.
- Pois viemos de parte do jornal A NOITE do Rio...
- O homem mudou, num relance,Fez-se sério. E visivelmente constrangido ao perceber o intuito de nossa presença:
- Ora, A NOITE a se preocupar comigo. Sou um homem humilde...
Em pouco, porém , as coisas mudavam. E no correr da conversa, foi-nos contando como lhe chegará as mãos a sorte grande.
- Comprei um bilhete e meio da Loteria Federal, da extração de 26 de dezembro, em ocasiões diversas. Na tarde da extração da loteria,conferi apenas o meio bilhete, esquecido de que o outro também corria naquele dia. E sinceramente sinceramente fiquei triste, estava “branco”. Os amigos no bar riam da minha pouca sorte, e eu mesmo estava decepcionado, pois pusera o melhor palpite naquele bilhete. Nisto , entra de imprevisto o rapaz da Agencia Lotérica, a gritar que eu tirará a sorte grande. Diante do bilhete branco, já conferido, aquela cena deixou-me ainda mais desesperado. O rapaz porém, grita-me que eu havia comprado o outro bilhete inteiro, e com efeito, lá estava ele na gaveta do balcão: n; 12.711...
- Que sensação teve?
- Nem lhe digo, 200 Contos, assim de uma sentada, deixa a gente tonta. Em todo o caso, o que eu sei é que foi uma sensação gostosa. E ria-se , o Sr. Demário. Observamo-lhe que ele já mostrava uns ares de capitalista...
- Nada disso. Sou o mesmo homem humilde de sempre. Fiz-me no trabalho e continuarei a trabalhar. Vou comprar esta casa, melhorar o Bar. Interrompendo-o fazendo alusão ao seu aspecto físico, de um homem dado a abastança, para esclarecer a nossa inocente insinuação.Sempre fui gordo, é verdade. Peso cem quilos. Alias, sou um cozinheiro de mão cheia, e fui muito tempo maitrê de hotel. E rindo conclui :
- Compreende-se , assim, como antes de ser rico eu já podia ser gordo...
JORNAL A NOITE (RJ)-QUARTA FEIRA, 15 DE JANEIRO DE 1936.
Conhecer um homem, a quem a fortuna, através de um bilhete de loteria, teve o capricho de visitar inesperadamente , é sempre uma tarefa agradável. Mesmo que se tenha de viajar de Ponta Grossa até Guarapuava, rompendo trinta léguas de estrada áspera, na diligência que faz o serviço de passageiros e de Correio, em excursões periódicas, com uma regularidade precária. Aboletados no duro assento de um Ford V-8, convertido em jardineira, ei-nos rumando o terceiro planalto, enquanto uma chuvinha irritante alagava a paisagem. Valeria a pena o sacrifício?De Imbituva, uma boa auto estrada até Prudentópolis, já o caminho era vencido com maior dificuldade, lama, buracos e trilhos enormes abertos pelos carroções puxados por nove ou dez cavalos. E lá íamos aos bóleos, atras do homem dos 200 Contos...Duas horas depois de Prudentópolis começava a roncar , para vencer a imponente serra da esperança. Pedaço duro de conquistar. Mas bonito de se ver. Uma serrania majestosa, que faria abrir os olhos a muito turista desavisado. Agora o terceiro planalto. Mais algumas horas de viagem difícil e Guarapuava surge de imprevisto, numa volta da estrada. Cidade antiga, casario velho, também fundada ha 116 anos ...Depois de algumas informações , tocamo-nos para o “Bar América” instalado num corredor de casas acachapadas, bem no centro da cidade. Seu proprietário, disseram-nos ,era pessoa que procurávamos.
- O Sr. Francisco Demário?
- Sou eu mesmo.
- Pois viemos de parte do jornal A NOITE do Rio...
- O homem mudou, num relance,Fez-se sério. E visivelmente constrangido ao perceber o intuito de nossa presença:
- Ora, A NOITE a se preocupar comigo. Sou um homem humilde...
Em pouco, porém , as coisas mudavam. E no correr da conversa, foi-nos contando como lhe chegará as mãos a sorte grande.
- Comprei um bilhete e meio da Loteria Federal, da extração de 26 de dezembro, em ocasiões diversas. Na tarde da extração da loteria,conferi apenas o meio bilhete, esquecido de que o outro também corria naquele dia. E sinceramente sinceramente fiquei triste, estava “branco”. Os amigos no bar riam da minha pouca sorte, e eu mesmo estava decepcionado, pois pusera o melhor palpite naquele bilhete. Nisto , entra de imprevisto o rapaz da Agencia Lotérica, a gritar que eu tirará a sorte grande. Diante do bilhete branco, já conferido, aquela cena deixou-me ainda mais desesperado. O rapaz porém, grita-me que eu havia comprado o outro bilhete inteiro, e com efeito, lá estava ele na gaveta do balcão: n; 12.711...
- Que sensação teve?
- Nem lhe digo, 200 Contos, assim de uma sentada, deixa a gente tonta. Em todo o caso, o que eu sei é que foi uma sensação gostosa. E ria-se , o Sr. Demário. Observamo-lhe que ele já mostrava uns ares de capitalista...
- Nada disso. Sou o mesmo homem humilde de sempre. Fiz-me no trabalho e continuarei a trabalhar. Vou comprar esta casa, melhorar o Bar. Interrompendo-o fazendo alusão ao seu aspecto físico, de um homem dado a abastança, para esclarecer a nossa inocente insinuação.Sempre fui gordo, é verdade. Peso cem quilos. Alias, sou um cozinheiro de mão cheia, e fui muito tempo maitrê de hotel. E rindo conclui :
- Compreende-se , assim, como antes de ser rico eu já podia ser gordo...
Nenhum comentário:
Postar um comentário